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    Anulação de cláusula normativa e a participação dos sindicatos como litisconsortes necessários

    Junto a crescente consciência de classe movida pelo movimento operário na Revolução Industrial, surgiram os sindicatos para representar a categoria como um todo. No Brasil, com a vigência da Constituição Federal de 1988, iniciou-se a transição da democratização do Sindicalismo, ampliando o direito de negociação.

    Com uma estrutura corporativista, os entes sindicais são compostos pelos Sindicatos, Federações e Confederações, e fora dessa hierarquia também as centrais sindicais. Esse sistema portanto, tem capacidade para defender e lutar pelo direito da categoria, principalmente ao negociar Acordos e Convenções Coletivas, cujo reconhecimento está previsto no artigo 7º, XXVI, da CF.

    lei 13.467/17, conhecida como reforma trabalhista, atenta à necessidade de valorizar as diretrizes criadas pelas negociações coletivas como verdadeira fonte autônoma do direito do trabalho, restringiu o ativismo judiciário e priorizou os princípios da autonomia privada coletiva e da intervenção mínima do Estado, acrescentando à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) os artigos 8ª, 444, § único e 611-A, 611-B.

    Antes da vigência da norma supracitada, era comum que as regras produzidas a partir autonomia privada coletiva dos Sindicatos – instrumentalizada por meio Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho (ACT e CCT) – tivessem a sua validade questionada em reclamações trabalhistas individuais, competindo ao Poder Judiciário, a despeito de uma análise sistemática do ACT ou da CCT, declará-las, isoladamente, nulas ou não.

    Contudo, com a nova legislação, o negociado passou a prevalecer sobre o legislado, desde que observado determinados preceitos legais, inclusive no que diz respeito às matérias que não podem ser alteradas, conforme previsão do artigo 611-B da CLT. Além disso, é importante salientar a intenção do legislador de proteger, prestigiar o interesse da categoria e preservar a autonomia privada coletiva ao incluir na CLT o artigo 611-A, §5º, o qual prevê a necessidade de os sindicatos subscritores da Convenção ou do Acordo Coletivo atuarem como litisconsortes passivos necessários nas ações que visam a nulidade de cláusulas normativas.

    Portanto, segundo a nova ordem processual trabalhista, quando uma ação individual ou coletiva buscar a declaração de nulidade de uma cláusula normativa, será necessária a participação de todos os entes sindicais na lide, na condição de litisconsortes necessários, nos termos do artigo 114, do Código de Processo Civil.

    Dessa forma, o legislador além de limitar a análise do julgador aos elementos essenciais do negócio jurídico, conforme artigo 104 do Código Civil, também deverão atuar no processo os entes sindicais, a fim de demonstrar aos Magistrados a importância teleológica do arcabouço normativo autônomo contido no Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho. Isto porque, mesmo que em um primeiro momento as normas coletivas pareçam desfavoráveis à categoria, somente as partes responsáveis pela negociação poderão demonstrar por qual motivo e sob qual contexto foram negociadas.

    Importante destacar que, assim como os atos normativos heterônomos que emanam do Poder Público, as normas coletivas também devem ser analisadas, interpretadas sistematicamente e à luz de todos os demais dispositivos do instrumento coletivo.

    O reconhecimento da validade integral da norma coletiva naquilo que não contraria os patamares constitucionais e civilizatórios mínimos dos trabalhadores, ganha extrema relevância com a positivação da vedação da ultratividade, acrescentada pela reforma trabalhista no artigo 614, §3º da CLT. Tendo em vista que os sindicatos patronais e empregadores poderiam recusar a negociação coletiva e simplesmente retirar do trabalhador todos os direitos garantidos por convenções anteriores.

    Neste sentido, as partes concedem vantagens superiores aos patamares previstos no ordenamento jurídico trabalhista, em troca da adequação das situações nas quais as categorias estão inseridas, considerando que as realidades profissionais diferentes. Por este motivo, afigura-se curial e indiscutivelmente necessária a participação das entidades convenentes nas ações judiciais e coletivas como forma de viabilizar a demonstração de todos os fatos sociais e benefícios concedidos que antecederam a criação da norma.

    Nesse diapasão, destaca-se que a MP 808 de 2017 alterou a redação do artigo 611-A, § 5º, prevendo a necessidade apenas dos sindicados nas ações coletivas. Entretanto, com a perda da eficácia da referida MP em 23/4/2018, a redação original do artigo 611-A, §5º, da CLT foi restabelecida, reverberando a necessidade de participação dos sindicatos como litisconsorte necessário nos casos em que a ação judicial seja individual e a declaração de nulidade seja incidente. Isto se dá pela indispensabilidade de fomento ao debate em relação a validade das normas convencionais, visando preservar a autonomia da vontade coletiva para defender a vontade da categoria que deve prevalecer em relação à individual.

    Portanto, é essencial a participação dos sindicatos signatários nas lides que envolvam a nulidade dos Acordos e Convenções Coletivas, sendo o pedido expresso ou de caráter incidental, em respeito ao novo ordenamento jurídico e a vontade da categoria coletiva. 

    Vale ressaltar que o efeito da reforma trabalhista nada mais é que equilibrador, por autorizar a elasticidade e flexibilidade, podendo visar a proteção dos trabalhadores e também a saúde da empresa, sempre se adequando ao interesse e a realidade das partes. Então, respeitar o negociado e autorizar a participação dos sindicatos na lide, quando houver possibilidade de nulidade da norma coletiva, é honrar o princípio da autonomia privada e o fomento ao debate, em respeito ao novo ordenamento jurídico trabalhista.  

    Rebeca Bispo Bastos é advogada da área trabalhista do Tortoro, Madureira & Ragazzi Advogados. Com experiência em contencioso trabalhista no segmento de Direito bancário. Graduada na Faculdade de Direito São Bernardo do Campo e atualmente cursa pós-graduação em Direito do Trabalho na FGV.

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